O Brasil que vai bem.
A covid-19 impacta a economia, mas o agronegócio vive o melhor de sua história. O tempo é de vacas gordas, mas a sustentabilidade não pode ficar de lado.
Nos últimos meses, o gaúcho Maurício De Bortoli, de 40 anos, tem se dedicado a decifrar cores. Elas o ajudam a interpretar a produtividade de soja em sua fazenda de 9.000 hectares em Cruz Alta, no Rio Grande do Sul. Não é o olhar treinado desse representante da terceira geração de uma família de agricultores que entra em ação, mas sensores que, acoplados a sondas instaladas no solo, captam as ondas de luz emitidas pelas plantas e ajudam Bortoli a tomar decisões na lavoura.
Os sinais eletromagnéticos são enviados a um software que decodifica as cores das plantas e identifica a incidência de pragas ou a falta de nutrientes. “Com isso, é possível saber num estágio bem inicial se a planta está doente e o que é preciso fazer, usando fertilizantes ou defensivos na medida certa”, diz Bortoli.
A busca pelo detalhe fez com que a fazenda de Bortoli fosse a campeã em produtividade de soja no país em 2019 no concurso anual promovido pelo Comitê Estratégico Soja Brasil, uma das entidades mais respeitadas do setor. Sua propriedade produziu 124 sacas do grão por hectare (mais que o dobro da média nacional).
Atualmente, Bortoli produz cerca de 1,1 milhão de sacas de soja por ano na fazenda criada por seu avô Aquelino. Em 2018 e 2019, ele reinvestiu cerca de 15% do faturamento, superior a 100 milhões de reais, em novas tecnologias. O processo de gestão também foi aprimorado, com a criação de um conselho de administração e a contratação de profissionais do mercado em cargos de liderança.
As conquistas de empreendedores rurais, como as do gaúcho de Cruz Alta, dão alento a tempos sombrios para a economia brasileira. A pandemia do novo coronavírus deve fazer o produto interno bruto do país encolher até 9%. Mas, enquanto os demais setores da economia devem sofrer perdas amargas neste ano, o PIB do agronegócio deve crescer 2,5%, chegando a 728,6 bilhões de reais.
“Será o maior valor obtido na história pelo setor, algo bastante positivo em um ano em que a economia está tão cambaleante”, diz o economista Renato Conchon, coordenador econômico da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA). Ao mesmo tempo, o PIB da indústria deverá encolher 7,9%, seguido de uma queda de 9,8% no comércio e de 5,5% nos serviços, segundo projeção da FGV, que considera uma retração total da economia brasileira de 6,4%.
O agronegócio, que vem batendo um recorde atrás do outro, deve ser responsável por quase 24% do PIB brasileiro em 2020, uma marca histórica. A safra de grãos, de 250 milhões de toneladas, também deve ser a maior registrada até agora. “O agronegócio está sendo fundamental para ajudar a remendar o estrago causado na economia pelo coronavírus”, diz o economista Marcos Jank, professor e pesquisador sênior de agronegócio global no Insper. E o futuro é promissor: até 2027, o Brasil deverá atingir a marca de 300 milhões de toneladas de grãos.
Os portos de Paranaguá e Santos, por onde é escoada grande parte da produção brasileira, nunca tiveram tanto movimento. O embarque de alimentos aumentou 23% entre janeiro e abril em relação ao mesmo período do ano passado. De acordo com cálculos feitos exclusivamente para a EXAME pelo economista José Garcia Gasques, coordenador-geral de Avaliação de Políticas e Informação da Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, as exportações devem chegar a 102 bilhões de dólares neste ano, uma expansão de 6%.
Os números recorde do agronegócio em 2020 são possíveis porque o setor vive uma escalada de produtividade iniciada na década de 1970. Vem dessa época uma série de políticas públicas e investimentos no desenvolvimento de novas tecnologias que foram fundamentais para os ganhos de competitividade do setor. Com a criação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) em 1972, teve início o desenvolvimento de sementes adaptadas ao clima tropical — até então, elas eram importadas de países como os Estados Unidos.
Não demorou para que novas fronteiras agrícolas fossem abertas, com a expansão para o Cerrado e para a região que ficou conhecida como Matopiba, que envolve parte dos territórios de Maranhão, Piauí, Tocantins e Bahia. O desenvolvimento de novos sistemas de plantio, com a preservação dos restos vegetais que cobrem os terrenos e garantem maior presença de nutrientes, foi outro avanço importante. “A geração de riqueza e a produtividade do agronegócio não param de crescer há décadas graças a uma política pública de incentivo à pesquisa, à orientação técnica oferecida aos produtores e às novas tecnologias”, diz Gasques.
Com o PIB do agronegócio em crescimento, as empresas do setor estão contratando. É o caso da BRF, maior exportadora mundial de frango, que já abriu mais de 2.000 vagas em suas diversas unidades pelo país. A expectativa é que os resultados financeiros continuem a crescer. No primeiro trimestre, a empresa registrou uma receita líquida de quase 9 bilhões de reais, 22% mais do que no mesmo período de 2019.
“A demanda mundial por frango, principalmente pela China e pelo Oriente Médio, deverá continuar em alta”, diz Lourival Luz, presidente da BRF. Outras empresas do setor também surfam o bom momento. A Marfrig Global Foods, segunda maior indústria de carne bovina do mundo, deverá ter o melhor ano de sua história. A expectativa é que a empresa alcance uma receita de mais de 60 bilhões de reais neste ano, ante 50 bilhões em 2019. As ações já acumulam uma alta de 35% até agora. “As exportações estão aumentando devido a uma série de fatores globais e também porque o país é visto como um parceiro confiável, que não teve sua cadeia de produção afetada pelo coronavírus”, afirma Miguel Gularte, presidente da Marfrig.
Nos Estados Unidos, mais de 30 fábricas de carne bovina, suína e de frango tiveram de suspender suas atividades em abril e maio por causa da morte de funcionários em decorrência do coronavírus — entre elas estão as unidades da brasileira JBS. No Brasil, também houve casos de covid-19 em frigoríficos. Apesar do impacto ainda restrito, o governo chinês desabilitou no dia 30 de junho quatro unidades frigoríficas no país, entre elas plantas da JBS e da Marfrig, no Rio Grande do Sul e no Mato Grosso.
Não é só a demanda internacional que tem ajudado o agronegócio em 2020. As condições climáticas e a conjuntura também jogam a favor. Em maio do ano passado, o Centro Americano de Meteorologia e Oceanografia, dos Estados Unidos, já apontava que não haveria neste ano El Niño nem La Niña, fenômenos climáticos que causam excesso de chuva ou seca.
Além disso, corredores de umidade na Amazônia formaram-se de modo a provocar chuvas na hora certa e na quantidade exata, principalmente no Centro-Oeste e no Sudeste. A Região Nordeste também foi beneficiada por chuvas, devido ao esfriamento do Atlântico no Hemisfério Norte e ao aquecimento no Hemisfério Sul. Não se tem notícia de todos esses fenômenos acontecendo simultaneamente, o que favorece a agricultura brasileira de forma ímpar.
O planejamento dos empreendedores do agronegócio também contou pontos. “Os produtores aumentaram os investimentos em 2019 de olho nas oportunidades quase certas de 2020”, diz Conchon, da CNA. Os aportes em novos insumos, como sementes mais produtivas e fertilizantes de última geração, somaram 84 bilhões de reais no plantio da safra colhida em 2020, 10% mais em comparação com o ciclo anterior. Isso é reflexo de uma nova geração que chega ao agronegócio.
Uma pesquisa da consultoria McKinsey, realizada com 750 agricultores de todo o país, revela que mais de 70% dos jovens de até 35 anos se mostram mais dispostos a adquirir sensores e máquinas que funcionem com tecnologias avançadas, como a internet das coisas. Na faixa etária de 35 a 45 anos, os percentuais são parecidos. “Os netos dos fundadores das fazendas estão fazendo uma revolução no campo”, diz Nelson Ferreira, sócio sênior da McKinsey. “Eles acompanham as tendências e aprendem com as gerações mais velhas que o segredo é unir produtividade, novas tecnologias e um planejamento bem-feito.”
Luciana Dalmagro, de 34 anos, pertence à quarta geração de uma família de produtores rurais. Ela administra há cinco anos a fazenda do pai, Paulo Portugal, e fez da propriedade localizada em Sales Oliveira, no interior de São Paulo, uma das maiores e mais bem equipadas granjas do país, com abate de 3 milhões de aves por ano. Ali, investiu em sistemas de rastreabilidade e bem-estar animal que permitem a exportação de toda a produção para clientes na Europa que buscam produtos de alto padrão.
Equipamentos que simulam o nascer e o pôr do sol deixam os frangos “mais felizes”. Além disso, há mais espaço para eles: são criadas 13 aves por metro quadrado, 10% menos do que a média usual. Segundo estimativas de mercado, o faturamento de granjas com essas características é de alguns milhões de reais por ano. Dalmagro é formada em farmácia, fez mestrado em ciências e MBA em negócios — ela é a primeira na família a cursar MBA. “Quero me tornar uma gestora nota 10, algo cada vez mais importante no agro”, diz.
A guerra comercial e política entre os Estados Unidos e a China também tem ajudado o Brasil. Em junho, no último lance de disputas entre os dois países, o governo chinês orientou as principais empresas agrícolas estatais a deixar de comprar produtos dos Estados Unidos. Os chineses não gostaram das críticas do presidente americano Donald Trump a uma nova lei que pode pôr em risco a autonomia de Hong Kong, território que pertence à China. Desde 2018, a disputa comercial entre as duas maiores potências do mundo elevou as tarifas de importação de lado a lado, encarecendo os produtos agropecuários. “O Brasil, com sua imensa produção, é o grande beneficiário dessa disputa”, diz Gasques.
Pela primeira vez na história, os embarques de milho brasileiro para a China ultrapassaram as exportações americanas para o país. Entre janeiro e abril, o Brasil vendeu 37 milhões de toneladas de milho à China, enquanto os americanos exportaram 35 milhões de toneladas. A desvalorização do real em relação ao dólar e a alta produtividade de grãos no Brasil criaram ainda mais atrativos para o mercado chinês.
Os grãos brasileiros ficaram 23% mais baratos do que os americanos. Boa parte do sucesso do agronegócio é resultado da demanda crescente da China por alimentos. Maior parceiro comercial do Brasil, o país comprou 30 bilhões de dólares em produtos agrícolas no ano passado. A expectativa é que até 2025 esse valor chegue a 48 bilhões de dólares – um aumento de 60%.
O produtor rural Enio Fernandes acompanha diariamente as variáveis do agronegócio no mercado internacional. Dono de três fazendas em Palestina, em Goiás, que somam 5.000 hectares com soja, milho e açúcar, ele percebeu que havia uma nova oportunidade no horizonte. Em 2018 e 2019, um vírus fatal que atinge apenas os porcos dizimou metade do rebanho chinês, provocando a morte de 175 milhões de animais. O mercado, como um todo, percebeu que a demanda chinesa por proteína animal — não apenas de suínos mas também de aves e bovinos — entraria numa espiral crescente.
Por isso, Fernandes decidiu investir, pela primeira vez, em pecuária. Em 2019, ele comprou 2.000 cabeças de gado. Neste ano, a venda de bovinos destinados à exportação deve aumentar em 20% o faturamento das fazendas, chegando a 25 milhões de reais. “Assim como nas empresas mais competitivas do país, faço um planejamento bem estruturado dos investimentos ”, diz.
Mesmo com tudo isso, o Brasil ainda tem importantes desafios a superar. Um deles é a falta de conectividade no campo. Menos de 40% da área rural conta com sinal 4G. No interior das fazendas, a situação é ainda pior. “O sinal falha muito, e a maioria dos produtores tem dificuldade para usar sensores e máquinas modernas, autônomas”, diz Claudio Frischtak, da consultoria Inter.B, que realizou um estudo sobre o tema. “A solução passa pela desburocratização do processo de instalação de antenas e mudanças regulatórias no setor.”
A autorização para a instalação de torres e antenas, que depende do aval de cada prefeitura, costuma demorar meses a fio. É necessária uma farta papelada para o processo andar. Muitas operadoras desistem de ampliar a cobertura de internet no interior em razão da burocracia. Para resolver isso, só mesmo na marra. No ano passado, foi criado um projeto de lei, conhecido como Lei Geral das Antenas, que determina que, caso não haja uma resposta sobre os pedidos de licenciamento em 60 dias, a infraestrutura de suporte às redes de telecomunicação será instalada de qualquer jeito, com ou sem licença. A lei continua em tramitação no Senado.
Enquanto isso, histórias de prejuízos devido à precariedade da conectividade se repetem. O fazendeiro Fabio Tardivo, de 31 anos, que cultiva 1.400 hectares de soja e cana em duas propriedades, uma em Batatais, no interior de São Paulo, e a outra em Capetinga, em Minas Gerais, já perdeu a conta de quantas vezes ficou com máquinas paradas na lavoura por falta de sinal de internet.
“O sinal é tão fraco que muitas vezes nem o WhatsApp funciona, e os funcionários em campo não conseguem se comunicar comigo quando acontece algum problema”, diz. “Perdemos tempo e produtividade.” A ministra da agricultura concorda que é fundamental levar o sinal de internet ao campo. “Sem conectividade, o produtor não pode usar as novas tecnologias que colaboram para o aumento da produtividade”, disse Tereza Cristina à EXAME (leia entrevista abaixo).
O drama da falta de antenas é um problema de simples solução se comparado ao risco ambiental que paira sobre o agronegócio brasileiro. O desmatamento na Amazônia atingiu o pico dos últimos 11 anos em 2019 e, só nos primeiros cinco meses deste ano, a derrubada da floresta aumentou 34%. Em maio, foram destruídos 829 quilômetros quadrados na Amazônia, 12% mais do que no mesmo período do ano passado, segundo o Sistema de Detecção de Desmatamento em Tempo Real (Deter), do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). Em agosto do ano passado, o aumento capturado pelo Deter transformou o Brasil em vilão ambiental em escala global.
Passado quase um ano, o país não aprendeu a lição. O ministro Ricardo Salles, do Meio Ambiente, fez comentários nefastos à preservação ambiental na reunião ministerial de 22 de abril, que foi gravada e logo correu o mundo. Salles afirmou que era hora de “passar a boiada” e mudar as regras de proteção ao meio ambiente, já que a mídia estaria voltada para a cobertura do coronavírus. O estrago internacional da fala do ministro assumiu proporções gigantescas.
“Depois disso, o problema alcançou um novo patamar, com investidores internacionais ameaçando reduzir os aportes no Brasil”, diz Marcello Brito, presidente da Associação Brasileira do Agronegócio. Em junho, um grupo de investidores internacionais que administra 3,75 trilhões de dólares em ativos enviou uma carta à embaixada brasileira de oito países demonstrando preocupação com a falta de políticas públicas de conservação da floresta. O fundo norueguês Storebrand Asset Management, que administra 80 bilhões de dólares em ativos no mundo, é um dos signatários da carta.
“Pretendemos manter nossos investimentos em empresas brasileiras, mas é necessário haver uma regulação mais previsível em relação às políticas de meio ambiente que estejam alinhadas com a sustentabilidade”, disse à EXAME Jan Erik Saugestad, presidente do fundo. Hoje, o Storebrand tem 117 milhões de dólares investidos em 57 companhias brasileiras. Em maio, 40 empresas europeias, entre elas a inglesa Tesco, uma das maiores do setor de supermercados no mundo, ameaçaram boicotar os produtos brasileiros caso o governo não tome ações concretas para reduzir o desflorestamento.
Sem avançar na sustentabilidade, dificilmente o agronegócio dará novos saltos de crescimento, principalmente em relação às exportações. “Hoje, ter uma imagem negativa no cenário internacional em questões relativas ao meio ambiente pode trazer retaliações concretas no campo do comércio internacional e dos investimentos”, diz o embaixador Rubens Ricupero.
No Brasil do agronegócio que dá certo, a história é bem diferente. Não faltam bons exemplos dos produtores ligados à inovação e à sustentabilidade. No início desta reportagem, Maurício De Bortoli, o campeão em produtividade de soja brasileira, tem orgulho de investir em tecnologias que não só aumentam a produtividade como também ajudam a proteger o meio ambiente, com o menor uso de defensivos e outros produtos químicos. Luciana Dalmagro, que exporta toda a produção de frango para a Europa, colocou centenas de painéis solares em sua fazenda e investiu no reúso da água para tornar o negócio mais sustentável. O Brasil das novas gerações de produtores rurais é um arraso. Falta a infraestrutura e as políticas públicas ajudarem.
O AGRO É POP? NÃO NA BOLSA BRASILEIRA
Por governança e volatilidade, empresas evitam abrir o capital | Denyse Godoy
A despeito da importância para o PIB brasileiro, o agronegócio tem presença tímida na bolsa de valores. Quem quer participar do sucesso da agricultura e da pecuária nacional encontra poucas opções para ficar sócio comprando uma fatia de empresas do setor na B3. O segmento mais importante é o de carne. A JBS, dos irmãos Joesley e Wesley Batista, tem peso de 2% no Ibovespa, principal índice acionário da B3.
A BRF, dona da Sadia e da Perdigão, e a Minerva também estão no índice, mas é a Marfrig, que fabrica hambúrgueres para redes como o McDonald’s, a processadora de alimentos de melhor desempenho. Seu valor de mercado se multiplicou por quase 3 desde 2016, enquanto o Ibovespa subiu 62% e está perto do recorde, aos 8,7 bilhões de reais. A produção de celulose é representada por Suzano e Klabin, enquanto o setor de açúcar e álcool tem a Cosan. Mesmo assim, a fatia desses grupos, de 6,6%, equivale a um terço da dos bancos. Outros segmentos nem sequer aparecem entre os grandes.
O de grãos e fibras, com a Terra Santa e a SLC Agrícola, o de fertilizantes, com a Heringer, e o de beneficiamento, com a Camil, de arroz e feijão, nem integram o Ibovespa. O de frutas conta apenas com a Pomifrutas, que faliu em fevereiro. O primeiro motivo que afasta o agronegócio da bolsa é a governança corporativa. Muitas vezes, trata-se de companhias familiares, com gestão pouco profissional, sucessão indefinida e falta de interesse em dar satisfações a investidores minoritários.
O segundo é a volatilidade das commodities agrícolas. Fenômenos naturais incontroláveis, como a chuva, provocam oscilações no preço das mercadorias que afetam muito o valor das ações. “Uma queda brusca poderia pôr uma empresa em risco por causa de um fator sazonal”, diz a agrônoma Patrícia Amélia Bueno, fundadora da consultoria de fomento e inovação EasyHub e membro do grupo de trabalho de agronegócio do Instituto Brasileiro de Governança Corporativa.
Por essas particularidades, a bolsa de valores não é, na opinião de muitos especialistas, a melhor alternativa para uma empresa agropecuária captar recursos. O mercado de dívida, ao contrário, tem se mostrado mais amigável. A possibilidade de oferecer garantias como terras ou maquinário facilita conseguir dinheiro, e a criação de novas ferramentas nos últimos anos atraiu o pequeno investidor.
O estoque de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRAs), que são o título mais famoso, cresceu 44% desde o final de 2017, atingindo 43,2 bilhões de reais no mês de junho. “O crescimento do varejo de investimentos impulsionou os CRAs. São uma excelente alternativa para empresas menores acessarem o mercado de crédito”, afirma Odilon Costa, especialista em renda fixa da EXAME Research, unidade de análise de investimentos da EXAME.
MAIS INTERNET E MENOS DESMATAMENTO
O novo salto de produtividade do agronegócio depende do avanço da cobertura de internet e de políticas de sustentabilidade | Carla Aranha
O ano passado foi movimentado para a ministra Tereza Cristina, da Agricultura. Foram mais de 17 viagens a países como China, Indonésia e Egito. O objetivo era abrir portas para o agronegócio brasileiro — e, muitas vezes, também botar panos quentes nas polêmicas em que o governo brasileiro se envolvia. Agora, diante da pandemia do coronavírus, as prioridades ganharam novo foco. Em entrevista exclusiva à EXAME, a ministra comenta sobre as principais oportunidades e fragilidades do agronegócio brasileiro em um novo cenário internacional.
Como a senhora vê o aumento do desmatamento da Amazônia e as consequências econômicas disso para o Brasil?
Realmente, o desmatamento aumentou. Isso já está posto e é inegável. Há muito o que ser feito para reverter essa situação. Sou uma defensora do meio ambiente. Em junho, foi concluído o plano de combate ao desmatamento, conduzido pela Vice-Presidência, com metas de redução do desmatamento e de aumento da regularização fundiária. Agora temos de enfrentar novamente as queimadas na Amazônia, as quais recomeçam em agosto.
Como resolver ambos os problemas?
Foi criada uma operação do governo para coibir atividades ilegais, como grilagem de terras, exploração de minérios e ação dos madeireiros na Amazônia, na qual me empenhei. Em relação às queimadas, vamos começar neste mês um trabalho de assistência técnica aos pequenos produtores da Amazônia, que em geral não contam com orientação sobre as boas práticas de agricultura.
Por que neste ano o Plano Safra vai destinar 30% mais de subsídios para o seguro rural?
Estamos destinando 236 bilhões de reais, 6% mais do que no ano passado, para atender às maiores dificuldades dos produtores. Uma delas é o acesso ao seguro, que é caro no Brasil. Com essa subvenção, o produtor vai poder separar uma parte maior do faturamento para a aquisição de novas tecnologias, inclusive aquelas que colaboram para a sustentabilidade.
O que o país precisa fazer para que o agronegócio avance mais?
Precisamos melhorar a cobertura do 4G no campo. Temos tecnologias fantásticas, mas, muitas vezes, não é possível acessá-las porque a internet cai toda hora. Precisamos resolver esse assunto. Nossa infraestrutura de transporte, que já avançou, ainda é algo que encarece o custo Brasil, então também precisa ser melhorado.
Como a pandemia impactou o agronegócio?
O Brasil importa grande parte de alguns insumos utilizados nos fertilizantes. Um deles é o potássio. Com o coronavírus, ficou claro que não podemos depender tanto de importações de produtos tão essenciais. Estamos desenvolvendo alternativas para ampliar a fabricação local deles.
E quais são as oportunidades ainda não exploradas?
Há muitas. Podemos, por exemplo, aumentar os embarques de frutas. Quando estive na Índia, vi que há espaço para exportar mais café e até gergelim, muito consumido por lá. O Brasil pode se tornar a maior potência mundial do agronegócio.
Fonte: www.exame.com/